sexta-feira, 25 de março de 2011

"Algo que você não consegue entender" - Dimiclei pt.2

          A noite ia alta. Dimi estava sentado na escadaria de uma igreja. Considerou ali um bom lugar pois o movimento era escarço. As únicas coisas que se moviam eram as folhas das arvores embaladas pela brisa noturna proveniente do mar.
De repente, passos.
Duas pessoas. Um casal. Conseguia identificar por causa do característico "toc-toc" feito pelos saltos altos e pelo "tum-tum" da pisada firme de um sapato social. É agora! Dimi pegou o .38 e levantou. Foi até a parede da igreja e se escorou nela, ficando a dois passos da esquina. Os passos se aproximavam e, assim, o barulho dos saltos e solado. Ouvia vozes agora. Risada. A mulher ria. A sombra do casal se projetava na esquina e, gradualmente, ia crescendo. Mais um pouco... Mais um pouco... Mias um pouquinho...
- Perdeu, porra! - Dimi intimidou, sem muito alarde, ao dobrar a esquina com arma em punho. A mulher conteu um grito e o cara congelou. - Vamo, caralho! Passa a carteira! - Nenhuma ação. - Tá de sacanagem com a minha cara, seu cuzão? - Apontou a arma para a cabeça da loura. Ela trajava um curto vestido vermelho. - Eu mato essa vadia! Eu mato!
Eis que, então, heróicamente, o rapaz, trajando seu smoking italiano, sapatos bem engraxados e pretos, combinando com o terno; camisa vermelha e gravata listrada em preto, vermelho e branco, tira do seu bolso, calmamente, sua carteira, joga-a no chão, vira as costas e começa a correr dando inveja até mesmo a Yussain Bolt. A guria começa a chorar. Dimi fica surpreso e estático por umas dez batidas de seu coração acelerado pela adrenalina. Volta a si e pensa "Mas que grande filho duma puta..."
Dimi tira a arma da cabeça da loura e mira no fulho da puta fujão. Puxa o gatilho duas vezes. O covarde cai após gritar. A mulher gritava ainda mais. Dimi estava atordoado. Olhou para a guria. "Que disperdício...", pensou. Apontou a arma para ela. Os olhos da vítima arregalaram imaginando o pior. Seus lábios se moviam, mas não conseguia dizer nada. E não disse. Nunca mais. O impacto da bala em seu crânio dez a cabeça pender para trás violentamente, fazendo o corpo acompanhar o movimento tardiamente. A cabeça bateu no chão cerca de um segundo antes do corpo. Estava de barriga para cima e ainda era possível ver o desespero, a angustia e a tristeza nos olhos da pobre jovem.
A gritaria deu coragem aos vizinhos irem à janela ver o que ocorria, mas os que moravam em andares térreos e casas nada fizeram, com medo de uma bala perdida. Entretanto, aqueles que foram corajosos, viram que um homem trajando um canguru preto fugia da cena do crime não levando nada consigo, a não ser as vidas das vítimas.

FIM

segunda-feira, 21 de março de 2011

"Algo que você não consegue entender" - Dimiclei pt.1

   - Fala aí, rapazeada! - Saudou, Dimiclei, ao avistar a turma.
- Qual é, Dimi?! - Retribuiu Cleisson, seu melhor amigo.
- Neguinho, hoje eu to na fissura! Bora esculhachar? - Dimi tentava o amigo.
- Hoje não dá, Dimi. Promete pra Jóice. - Lamentou Cleisson
- Ah, qual é, mano? Tá de paumolecência pra mim, é? Puta que pariu! - Intimidou. A turma se olhou e depois olhou para os dois. Alisson fumava um baseado e ria de tudo.
- Que paumolecência o que, seu manézão?! Sou sujeito homem!
- Então mostra que é e vamo esculachá!
- Não tenho que te provar merda nenhuma. E outra, já provo! Tenho mulher e filho. E tu, só a boceta portátil, ô punheteiro. - Cleisson fazia um gesto subindo e descendo com o punho cerrado. A turma caiu na gargalhada.
- Tá de sacanagem com a minha cara, seu cuzão?! - Dimi tirou o revolver calibre .38 da cintura e apontou para Cleisson. A turma abriu um semi-circulo na volta dos dois.
- Qual é, Dimi?! Tá maluco?! Tira essa merda da minha cara! - Tentava intimidar o Dimi, mas estava morrendo de medo.
Alisson, achando graça da situação, pegou a arma de Dimi pelo cano e puxou para fora da mira de Cleisson. Dimi, ainda fora de si, nem hesitou, atirou na perna de Alisson, que caiu no chão gritando de dor.
- Tá maluco, filho da puta?! - Flaviano empurrou Dimi. Flaviano dava medo até em um homem armado. Tinha mais de um metro e oitenta de altura e era cavalamente forte. Muito forte. - Vaza daqui, senão eu quebro essa tua cara, seu pau no cu!
Dimi vacilou. Recuou dois passos e baixou a arma. Os amigos acudiam o ferido. Dimi botou largou a arma no chão.
- Ah, meu irmãozinho! Foi mal, maluco! Foi mal! - Dimi se aproximou.
- Some daqui! Seu merda! Fodido! - Flaviano berrou.
Dimi recuou. Pegou sua arma e saiu.

(Continua)

sábado, 19 de março de 2011

"Algo que você não consegue entender" - Simone pt.3

        - Paulo! Quem está aí? - Novamente a moça pergunta com um certo tom de sono. Uma eternidade se passou desde que Simone declarou a frase que é capaz de fazer até mesmo o mais corajoso homem borrar nas calças.
- Nã... Ahm... É uma amiga minha, meu bem. - Paulo se levantou do sofá e fez sinal para Simone - Ela está com um probleminha e eu vou conversar com ela, ok?
- Que amiga?
- É a Simone.
- Simone?
- É. Nós vamos lá embaixo conversar melhor, ok?
- Ok... Não demora. E trás café, estamos sem.
- Pode deixar. Te amo! - Simone entendeu tudo. Não só pagou o maior mico de sua vida, bebendo ao ponto de não lembra o que tinha feito no outro dia, mas ficou grávida do idiota e o pior, um idiota comprometido, ou seja, ela, além de tudo, foi só uma puladinha de cerca. - Vamos? - Perguntou Paulo. Simone apenas assentiu e saíram.
        Estavam na calçada, a umas duas casas do edifício. Simone, para começar o papo, perguntou.
- Namorada? - Paulo olhou para ela e baixou a cabeça.
- Noiva.
- Interessante... - Ironizou.
- Como que você deixou isso acontecer, Simone?
- O que?!
- Por que você não tomou a merda da pílula?
- Como eu ia imaginar que tinhamos transado sem camisinha?!
- Simples, foi você quem pediu!
- O que!? Impossível!
- Deixa eu refrescar essa sua memória de bêbada, então? Estávamos no maior amasso, já no meu apartamento, quando, eu, pronto para ação, paro e vou pegar a camisinha na minha cômoda, daí, você me olha com a cara mais gostosa de safada que já vi na vida e me diz, diz não, MIA "Bala com papel não tem graça..."! - Simone arregalou os olhos. Está certo que ela não lembrava o que tinha acontecido, mas... Hey!
- E você não poderia pelo menos ter gozado fora?! E outra! Seu doente! Você não me conhece! Como ia saber que eu não tinha doença nenhuma!? Eu estava bêbada, seu imbecil!
- Ah, ok, e eu estava completamente sóbrio! Eu nem vomitei assim que cheguei em casa. - Era uma discussão perdida. Não adiantava. Simone não fazia idéia do que tinha se passado na noite, ele poderia falar qualquer coisa. De repente já até jogou verde quando disse que ela havia dito que... bala com papel não tem graça... Deus do céu! Simone sentiu os olhos marejarem e baixou a cabeça. - E então, espertinha? Retruca essa agora! - Simone começou a chorar. - Isso! Chora! De repente todos os SEUS problemas vão embora.
- Meus?
- Isso aí - Paulo apontou para a barriga de Simone. - é problema seu. VOCÊ foi relaxada. VOCÊ fez isso.
- Claro, seu animal! Eu transei comigo mesma e fiquei grávida! Gerei uma criança por meiose!
- Meia-o-quê?!
Simone suspirou.
- E o pior de tudo, fiz junto com uma ameba!
- O negócio é o seguinte, você é enfermeira certo? Deve conhecer algum médico que possa tira ISSO daí.
- Vocês está louco, seu retardado! É uma criança que eu carrego aqui! Não é ISSO! É o seu filho, seu merda!
- Não! É o SEU filho! Ou você acha que a mãe do meu filho vai ser uma qualquer que dá, bêbada, pro primeiro que aparece pela frente? - Simone fervia de raiva. - E o pior, não lembra PORRA nenhuma do que aconteceu! - Simone enfiou a mão na cara de Paulo. Literamente enfiou. E não foi um tapa, estilo novela. Foi um murro. Bem no olho direito. Algumas pessoas que passavam por ali viram e estacaram. Paulo parecia não ter acreditado no que havia acontecido.
- Sua vagabunda! - Paulo revidou a gentileza, da mesma maneira, fazendo Simone cair no chão. Dois rapazes que viram tudo correram na direção dos dois. Paulo se curvou e apontou o indicador direito para o rosto de Simone, que havia levado as mãos ao rosto, e disparou todos os xingamentos que conhecia.
- TÁ MALUCO, SEU IMBECÍL! - Um dos rapazes empurrou Paulo para trás, o outro foi ver como Simone estava.
- Cai fora que o assunto não é contigo! - Praguejou Paulo.
- É uma mulher, seu imbecil! - Gritou o que acudia Simone. - Você está bem, moça? - Perguntou o adolescente. Simone não conseguia responder, além de estar atordoada, chorava, e muito.
- Cala essa boca seu pirralho, se não enfio a mão na tua cara também! - Gritou Paulo. O rapaz se levantou.
- Cai dentro então, mané!
- Roberto, cala essa boca e ajuda a moça - O outro ordenou. - E tu, seu merda, sabia que ele é menor? Não basta bater numa mulher ainda quer bater num menor?
- E você é maior? - Perguntou Paulo.
- Sou! Sou Advo... - Paulo não deixou o rapaz terminar, enfiou um soco na cara do homem. Mais pessoas vieram ver o que acontecia. O ferido se embolou com Paulo. Rolavam no chão e trocavam socos. Um tumulto se formou. Roberto se levantou e foi acudir o amigo.
- Chamem a polícia! - E deu um ponta pé nas costelas de Paulo, que desferia socos, sentado em cima do rapaz, em sua face. Paulo caiu para o lado esquerdo com o impacto. Roberto continuou chutando. Um circulo se formou na volta dos quatro. A maioria das pessoas apenas assitia. Outros filmavam, mas ninguém tentou apartar a briga.
Cinco minutos depois, Paulo estava estirado no chão, totalmente machucado, provavelmente com alguma costela quebrada - o nariz era uma certeza. Roberto acudia o amigo, que atendia pelo nome de Rafael, e Simone. Roberto tentava falar com ela, mas ela apenas chorava, num misto de vergonha, desgosto, raiva e tristeza.
- Hey, moça, não se preocupe que eu sou advogado. Vamos socar direitinho no rabo desse filho duma puta. Rafael falou ao se sentar do lado de Simone. - Está me ouvindo? Não se preocupe, vai dar tudo certo. A polícia está chegando. - Simone apenas assentiu, mas chorava muito. - Hey, fique calma... - Rafael abraçou-a. - Vai ficar tudo bem. Olhou pra multidão que passou a se dispersar. Não acreditava que, depois que Paulo foi ao chão, eles haviam aplaudido. Como se aquilo fosse um espetáculo. Algo combinado. Só faltava jogarem trocados num chapéu virado no chão. - Vocês não tem mais o que fazer não?! - Gritou Rafael.
Mais cinco minutos e a polícia chegou. Rafael e Roberto contavam tudo o que tinham visto, mas não mensionaram que Simone havia dado o soco primeiro. Paulo dizia que havia sido agredido por Rafael e disse que Simone havia lhe dado uma bofetada primeiro. Os dois oficiais olharam para Paulo e depois para Simone e seguraram um riso. Simone contou que estava grávida de Paulo e que ele queria que ela abortasse, e ela queria ter a criança, então, ele lhe deu um soco no rosto - Rafael a instruiu para dizer isso. Os policiais levaram Paulo para a delegacia e liberaram Simone e os dois rapazes.
Hoje:
*Paulo cumpre a pena por agressão a mulher e tentativa de homicidio de menor e incapaz.
*Andréia, noiva de Paulo, vai visitá-lo na prisão toda semana.
*Sofia tem Sete anos e é o orgulho da mamãe Simone, do papai Rafael e do irmão mais velho Roberto.

FIM

quinta-feira, 17 de março de 2011

"Algo que você não consegue entender" - Simone pt.2

        “Não! Nãonãonãonãonãonãonãonão! Isso não pode estar acontecendo! Não é possível! Puta que pariu! Putaquepariuputaquepariuputaquepariuputaquepariuputaquepariu! Grávida!! E o pior! Grávida do maior mico que já tive na vida! CARALHO! O filho duma puta não usou camisinha! É lógico! Se aproveitou que eu estava bêbada! Desgraçado! Como não tomei a merda da pílula do dia seguinte? Por que essa idéia genial não passou pela minha cabeça! E agora? O que vou dizer a minha família? Ao meu pai! Deus do céu! Vai me matar!”
- Flávinha, quero repetir o teste.
Flávia, que olhava com curiosidade para Simone, agora olhava-a com um ar curioso.
- Que aconteceu? Deu positivo?
- É... Mas não pode ser...
- Sem problemas, amiga, fazemos de novo.
- Obrigada. – Falou com um olhar de quem não estava presente na sala.
Uma hora depois...
- Ó, a prova real. – Flávia entregou o novo envelope para ela. – Simone, quero que tu saibas só que esses testes tem uma porcentagem de acerto absurdamente altas, mais de 95%... Pode ter sido um erro técnico, mas é raro acontecer...
- Eu sei... Eu sei... Mas é que... queria ter certeza absoluta.
- Entendo.
Simone abriu o envelope.
Deixou-o cair no chão, virou as costas e foi embora sem dizer nada, mas a resposta era óbvia.
“Não pode ser verdade isso! Não! Nãonãonãonãonãonãonãonão! Isso não pode estar acontecendo!” repetia para si mesma. “O que vão pensar de mim?! Está certo que já tenho idade para ser mãe... Não sou mais uma guriazinha, mas... Agora não... Nem marido eu tenho! Meu pai vai me matar... Ah vai! Certo que sim!”
Então, uma idéia veio a sua cabeça. “Aborto! Claro! Eu conheço alguns médicos que fazem! Acho que eles fariam pra mim sem problema nenhum! Claro...”
Parou e pensou no que havia pensado. Não! Jamais isso! Foda-se a sociedade e as morais que ela impõe. Mãe solteira grávida de uma farra da qual nem se lembra é feio para a sociedade... Mas assassinato... E o pior, assassinar uma criança... Sua criança... Seu filho... Ou filha!
Simone sorriu com a idéia de uma menininha correndo pelo seu apartamento. Fez o sinal da cruz e pediu perdão silenciosamente por ter pensado em aborto. Iria até a casa do Paulo e conversaria com ele. Teria que ir até lá de surpresa. Descobriu que tinha anotado o numero dele no dia que saiu da casa do imbecil e apagou o número. Ele também não ligara. Na verdade ligou uma vez, mas ela não atendeu. Não queria falar com ele. Uma porque era um imbecil e a outra era porque pagara maior mico de sua vida, justamente para aquele imbecil.
Decidiu, hoje mesmo iria a casa do Paulo e falaria com ele.
O fim de semana chegou e Simone não foi a casa do Paulo. Vergonha. Alegava isso. Ensaiou 37653625 vezes o que iria dizer. Certa vez chegou na esquina da casa dele e deu meia volta. Mas hoje era o dia. De hoje não passaria. Hoje, Domingo seria o dia em que iria dizer ao... Ao... Não conseguia pensar que aquela... Coisa... Seria o pai de seu filho. Mas seria hoje. E foi.
Chegou defronte ao prédio do Paulo. Respirou fundo. Foi.
Era por volta de 14h de uma tarde ensolarada de domingo. O porteiro, um senhor de cabelos grisalhos e olhos castanhos, magro e trajando o uniforme - uma camisa social azul clara e calças sociais pretas - do prédio viu Simone entrando. Perguntou aonde ela ia.
- Apartamento do Paulo Machado.
- Ah, sim... Pode subir, ele está em casa. – Falou o senhor, não conseguindo esconder a admiração pela beleza da loura.
- Obrigada. – Sorte grande!
Entrou no elevador. Ensaiava o que ia dizer e as possíveis respostas que poderia ouvir. “Vá se foder, caralho” era uma. Respirou fundo. Parece que era o que seria. Mãe solteira. Mas e se o infeliz ficasse contente? Não namoraria-o! Pediria uma pensão e o desgraçado teria direito de ver a criança só nas quartas-feira. Fim de semana o cacete. Capaz de trancar a criança em casa e sair para vadiar. Arrumar uma cretina qualquer, arrastar para o apartamento e... E... Fazer o mesmo que fez com ela mesma... Como pode deixar isso acontecer! Era isso o que pensava de si mesmo. Uma cretina. Uma vadia. Uma qualquer. Uma mulher que bastava beber que se transformava numa vagabunda e ia pra cama com o primeiro imbecil que aparecesse. Grávida de um imbecil... Definitivamente não era isso que tinha planejado para si mesma. Não era a vida que queria. Abortar não! Jamais! Será a sua criança. Receberá todo o carinho que merece. É isso. Crianças são uma dádiva. Um presente de Deus. Mesmo as noites em claro por causa de crises de choro para se trocar uma maldita fralda... Valerá a pena. Simone queria chorar, mas sorria. Seria mamãe. Ela, que sempre gostou de crianças. Seria uma mamãe. Sentiu os olhos marejarem. Assim que o elevador chegou ao andar de Paulo – o sexto – já tinha lágrimas escorrendo pelo rosto. Enxugou-as com as costas das mãos. Saiu do elevador e respirou fundo.
Era um corredor largo, com uma porta de apartamento logo a esquerda, fechando-o. Número 61. Não era esse. A direita o corredor bifurcava para a direita, novamente. Girou o corpo a para a direita, ficando de costas para a primeira porta descrita. Em frente estava um apartamento no fim do corredor - número 64, também não era esse - e a bifurcação a direita. O apartamento não era o da frente, então, dobrou a direita. Agora havia três portas, duas a esquerda e uma a direita. A primeira da esquerda dava para as escadas, sobrando as outras duas, uma de frente para a outra, no fundo do corredor. Simone caminhou até lá a passos que se arrastavam. Analisava o revestimento do corredor. Lajotas verdes do tamanho do palmo de uma mão adulta. O piso era uma cerâmica porosa e clara, provavelmente branca, mas a sujeira no chão não dava certeza. Simone foi até o fim do corredor. Olhou para a porta da esquerda. Número 63. Não era essa. Só pode ser a da direita.
Simone respirou fundo novamente. Abanou o rosto com as duas mãos. Parou. Observava suas mãos. Tremiam. Não só as mãos. Simone tremia completamente. Claro, sabia que não seria fácil bater na porta de um homem que você mal conhece e dizer “Oi, lembra de mim? Pois é! Estou grávida de você!”. Ainda mais esses cachorros que adoram brincar de fazer filho, mas depois não assumem nada. Desanimou-se. Pensou em ir embora. Girou sobre os calcanhares e deu um passo em direção ao elevador. Parou. Pensou. Respirou fundo. Voltou e, sem pensar, apertou a campainha.
Esperou.
Nada.
Apertou de novo.
Nada.
Não devia estar em casa... Apertou mais uma vez.
- Já vai! Já vai! Onde é o incêndio!? – Escutou abafado do outro lado, seguido de um murmúrio indecifrável.
Paulo tossiu e pigarreou. Destrancou a porta e abriu-a. A porta deu uma leve rangida e Simone olhou para ele. Paulo se surpreendeu. Trajava apenas calça jeans.
- Ora, ora... Se não é a Simoninha... A que devo tamanha honra?! – Fez uma reverência. – Por favor, entre em meus humildes aposentos. – Simone nada disse, apenas respirou fundo e entrou. – Oi, tudo bom, Paulo, como tem passado? – Debochou Paulo, assim que a loura entrou.
Simone foi até o sofá da sala e ficou de pé, de costas para o sofá e olhando para Paulo. Paulo fechou a porta, foi até Simone e, com um gesto de mão, ofereceu assento para a moça.
- Obrigada. – Simone disse ao sentar.
- Que bom, reaprendeu a falar. – Debochou.
- Sem gracinhas, por favor. – Protestou.
- Ok, ok... Senti saudades... Liguei mas você não atendeu e...
- Eu tenho uma coisa muito séria pra te dizer, Paulo. – Paulo olhou para Simone com uma certa apreensão, mas disfarçou, continuando.
- Como eu dizia, também – frisou o também - senti saudades, não tive nenhuma noite daquelas com nenhuma outra mulher e...
- Eu estou grávida, Paulo. – Simone declarou. Assim. Do nada. Paulo ficou estático. Ainda mais quando, menos de um segundo depois de Simone terminar, ambos ouviram “Você está conversando com quem. Paulo?” vindo do quarto. Voz de mulher. Mulher jovem. Paulo tirou o sorriso da cara e Simone tremia.

(Continua)

segunda-feira, 14 de março de 2011

"Algo que você não consegue entender" - Simone pt.1

“Muito bem, Simone, vamos apenas lá e comprovar que é somente neurose da sua cabeça”.
Simone trabalha como enfermeira no hospital geral da cidade F. Sempre foi fascinada pela profissão. Com sete aninhos de idade já dizia, quando perguntavam para ela o que seria quando crescesse. Olhava para seu interlocutor, com seus lindos olhinhos azuis e seus cachinhos dourados, e dizia “Enfermeira”, com uma vozinha aguda, porém doce. Nada de médica, veterinária ou, como um menininho me disse uma vez, “Dotô di quiança”. Não. Simone tascava “Enfermeira”. Com o “i” depois do “e” e tudo.
Era abril e Simone estava de férias. Na primeira noite que entrou de férias, mesmo depois de um plantão de 14 horas, reuniu alguns amigos e saíram para comemorar em uma casa noturna, onde era conhecida por freqüentar somente a “boa gente”. Foi nessa noite que conheceu um rapaz. Sujeito boa pinta. Era mais novo que ela. Simone tinha... Bom, não se revela a idade de uma mulher, mas, digamos que Simone é mais vivida.
Naquela noite, Simone queria muito beber. Sempre sabia o momento exato de parar. Bastava sentir as veias pulsando-lhe as têmporas. Mas naquela noite ela queria extravasar um pouquinho. Sem abuso. Mas passar um pouco da conta. Ninguém é de ferro, e beber para comemorar não é feio. Feio é beber para afogar as magoas. Os dois meses que antecederam suas férias foram um caos total naquele hospital. Em fevereiro teve um surto de Dengue na cidade e em março, carnaval – foi tarde naquele ano – e uma enchente na cidade e em algumas outras vizinhas lotaram o hospital.
Era isso mesmo que iria fazer. Iria beber. Se acontecesse de cair no chão, tinha duas amigas e um amigo para carregá-la até sua casa. Fred, um colega enfermeiro – e grande amigo - estava de carro, oras.
O erro de Simone, naquela noite, foi não ter dado por conta de que saíra exausta de um plantão de 14 horas.
- Estou seca... Preciso de um drinque. – Falou Simone, assim que ela e os três amigos chegaram na festa.
- O que? – Falou Marta inclinando o ouvido para perto de sua boca. Não escutara devido ao barulho da boate. Fred e Júlia Andaram em direção a um casal sentados em uma mesa na área VIP.
- VOU COMPRAR UMA BEBIDA! – Repetiu.
- Tá bom! Vamos estar ali. – Marta apontou para onde Fred e Júlia se dirigiam.
Simone, então, foi até o bar. Arrancava suspiros e algumas palavras chulas dos homens, por onde passou. Alguns não sabiam se olhavam para as pernas que o vestido branco deixava comportadamente a mostra - perguntavam-se e imaginavam como seriam elas sem a seda por cima – ou para o decote em “U” que o vestido fazia, mostrando 1/3 de cada seio ou, ainda, para os quadris que o vestido cruelmente insistia em realçar. Homens boquiabertos e mulheres com inveja/desdém.
- Uma caipirinha, por favor. – Disse/gritou assim que o Barman fez sinal para ela. Entregou a comanda, e o rapaz fez um “X” em um dos quadradinhos que ficavam ao lado de onde dizia o nome da bebida.
Após dispensar dois caras, um maconheiro – fedia a erva – de cabelo encaracolado seguido de um boneco de academia, chegou sua caipirinha. Pegou o copo e foi em direção aos amigos.
- Quem era aquele bofe sarado? – Perguntou Fred.
- Sei lá, cara babaca. – Respondeu, Simone.
- Babaca, mas um tesão. Daria até ficar assado!
- Me poupe, Fred. Me poupe! – Simone protestou, e todos riram.
- Me da um gole? – Perguntou Marta.
- Claro. – E entregou o copo para a amiga morena de cabelos crespos, negros, nariz grande, mas com corpo e olhos fazendo uma disputa desgraçada de beleza.
- Atenção, Simoninha, Bofe as 6 horas. - Disse Fred.
Simone deu uma disfarçada e em seguida olhou. Fingia que ajeitava o cabelo. Viu um rapazote, com certeza era mais novo que ela, não sabia quanto. De repente não era tão mais novo. Podia ser só aparência. Ele olhava para ela e para Marta, como se as comparava. Definitivamente estava fazendo-o, pois homens não fingem estarem fazendo algo, eles fazem algo. Percebeu que ele olhava mais para Marta.
- Ta pra ti, Marta. – Cutucou-a.
Marta disfarçou mexendo em sua bolsa e olhou.
- És tu mesmo, meu gurizinho. Vem pra mamãe! – Aprovou.
- Ih... Perdemos a amiga... – Falou Simone.
- Tu que fez a besteira de mostrar pra essa tarada que ele ta secando ela. – Disse o Fred com tom e olhar de deboche.
Marta virou-se de costas para o admirador, ajeitou o decote do vestido preto e curto e foi em direção a sua presa. O grupo acompanhou com o canto de olho e não puderam deixar de rir da surpresa nos olhos do rapazote pelo fato de Marta ter ido até ele. Os amigos que estavam com ele saíram rápido da volta dele. Pareciam até mesmo assustados. Com certeza eram novinhos.
- Estou até vendo... Amanhã o bofinho vai estar ligando pra ela, todo apaixonado e ela pedindo pra eu atender o telefone... – Suspirou Fred.
- Até parece que tu vais fazer uma voz de homem. – Debochou Simone.
- Afugenta eles muito mais a minha voz de biba, ô mocréia. – Retrucou Fred. E os dois riram. – Hey... Onde a Júlia está indo? – Perguntou.
- Aquele ali não é aquele imbecil por quem ela é toda apaixonadinha, o tal do Gabriel? – Perguntou Simone.
- Ah, não! É ele mesmo! Achei que ela tinha esquecido aquele imbecil já! – Suspirou e balançou a cabeça. – Vou lá por um juízo naquela cabecinha. – E saiu.
- Olha o que tu vai falar, ela só tem dezessete!
- Fala mais alto que o segurança não botou a gente ainda pra fora! – Debochou Fred.
Simone olhou para o casal de amigos do Fred. Estavam no maior amasso. Suspirou e foi até o bar de novo.
A noite se desenhava solitária para Simone. Marta estava quase engolindo o gurizote. Fred discutiu com Júlia e acabou levando-a para casa, quando o tal do Gabriel passou agarrado com uma guria. Restava-lhe agora seus 40 reais e um bar com bons drinques.
Eis que, então, Simone acordou.
Era de manhã. Não tinha de fato aberto totalmente os olhos, mas uma claridade lhe incomodava. Abriu-os lentamente. Estava num quarto. Não era o seu. De Fred, talvez? Não. Alguma coisa se mexeu na cama. Girou o queixo rapidamente para o lado. Prendeu um grito. Um cara. Ali. Nu. Então viu que ela também estava do modo como veio ao mundo. Oh Deus, Oh Deus, Oh Deus, Oh Deus! Como foi parar ali? Dor de cabeça. Levou a mão a cabeça. Pensapensapensa. Dor de cabeça. Ressaca. Como foi deixar isso acontecer? Ou melhor, como seus amigos DEIXARAM isso acontecer? Ah, o cara deve ser algum conhecido. Um amigo? Um ex? Inclinou o corpo para ver quem era. Deus do céu... Nunca viu mais gordo. Pensapensapensa, Simone! Pensa! Teve uma idéia. Sorrateiramente iria sair da cama e, em seguida, daria o fora dali. Simone girou devagar sobre a cama e calmamente colocou os pés no chão. Carpete. Macio. Boa sensação. Levantou-se. Ficou de pé e varreu o quarto com os olhos. Encontrou o vestido, mas não sua calcinha. Olhou, depois olhou de novo, novamente e mais uma vez. Nada. Azar. Catou o vestido do chão e, quando ia colocá-lo...
- Já vai, Simone? – Uma voz falhada seguida de um pigarro se fez ouvir no quarto. Simone gelou. E agora. Fora pega no ato.
- Pois é... É... É que... Eu tenho que ir trabalhar, entende? - O cara se sentou na cama, com tudo a mostra, com uma cara de poucos amigos, mas era pelo fato de estar se acostumando com a claridade. Simone olhou para ele, e em seguida virou-se, mas lembrou que estava tão vestida quanto ele. Corou. – Vira pra lá, por favor!
O rapaz deu uma risada leve.
- Não tem nada aí que eu não tenha visto. – E se virou.
Simone bufou e saiu do quarto. Colocou o vestido e depois voltou. E flagrou o cara abaixado pegando a cueca no chão do quarto. Assim como entrou no quarto, saiu. Corou de novo.
- Não esquenta, guria... – O Fulano falou.
- Meus sapatos estão aí?
- Pode entrar, já estou decente. – Debochou. Simone não se importou.Entrou no quarto e pegou seus sapatos.
- Não queres tomar um café?
- Não, obrigada. Tenho que ir pro trabalho.
- Então a história de estar comemorando o início das suas férias era mentira? – Abriu um sorriso. Simone não se deu conta mas sua boca ficou aberta por uns três segundos, fazendo o ciclano dar uma risada. – Estou vendo que tu tomastes um porre daqueles mesmo então... – Ele sorriu e balançou a cabeça.
Simone corou novamente e baixou a cabeça. A maior vergonha que passara em toda sua vida.
- Lembras o meu nome? – O canalha insistia em torturá-la. Simone queria sumir. Daria tudo para que simplesmente virasse fumaça e “Ziuf!” saísse dali, pela janela. O desgramado ficou deliciando-se com o silêncio da pobre loura por alguns instantes, então, aproximou-se da coitada que estava com a cabeça baixa e com os cabelos tapando-lhe o rosto. – Paulo Machado, 25 anos, trabalhador autônomo, ao seu dispor. – Fez uma reverência. Simone olhou-o e nada disse no momento. Terminou de por seus sapatos e então falou.
- Preciso ir embora.
- Como quiser, senhorita. – falou enquanto fazia sinal para ela o acompanhar, ao passar pela porta do quarto - Peço desculpas se não fui de seu agrado. – Disse, por fim, ao chegar na porta de entrada de sua morada, que era na sala, logo após um corredor de 3 passos de tamanho. Simone viu sua bolsa em cima do sofá. Pegou-a e saiu.
Um mês depois...
“Muito bem, Simone, vamos apenas lá, e comprovar que é somente neurose da sua cabeça”.
Já era metade de maio e nada do famoso ciclo se completar. Não era a primeira vez que atrasara, mas estava encucada. Falou com uma conhecida que fazia os testes de gravidez e pediu pra fazer um. Esperou um pouco, cerca de uma hora. Não viu o tempo passar. Batia um bom papo com a moça – Flávia.
Um assistente do laboratório levou um envelope até Flávia, que, por sua vez, entregou-o a Simone.
- Ó, está aqui. – Falou simpaticamente.
Simone abriu, ainda descontraída pela bobagem que Flávia havia dito a pouco.
Então seu mundo virou de pernas para o ar pela primeira vez.

(Continua)

quinta-feira, 10 de março de 2011

"Algo que você não consegue entender" - Caso Sara

           Sara fazia sua tradicional caminhada de fim de tarde em uma avenida da cidade, conhecida como canalete.
            A avenida possui uma larga calçada que divide as faixas de trânsito de sentidos contrários. A calçada, por sua vez, também é dividida por um estreito corpo d’água, cujo leito foi concretado, assim como foi feito em alguns rios famosos, como o Tietê, por exemplo.
            Para evitar quedas para dentro da água, uma mureta vazada em pequeninas pilastras, semelhantes a grade de proteção de um berço, de cor bege se faz presente.
            Ao longo da mureta, existem, também, alguns recuos, em direção a água, onde se encontram bancos de concreto, com sua base na mesma cor da mureta, porém, o assento, é marrom.
            Entre a mureta e o leito concretado, há canteiros com hortênsias violetas e vermelhas, e mais algumas outras plantas que não recordo os nomes.
            Um lugar realmente belo para se fazer atividades ao ar livre e, até mesmo – por que não? – namorar.
            Enfim, Sara corria com seus tênis brancos, com detalhes rosa próximo ao amortecedor e no “peito do pé”. Usava uma calça suplex azul modelando ainda mais as suas lisas, macias e fortes pernas e coxas de dezessete anos de idade. O bumbum não descrevo aqui, poderia ser considerado, na melhor das hipóteses, um pervertido, mas acreditem, uma calcinha “G” ali se transformava em um fio dental.
            A camiseta branca era larga e tinha uma estampa da Betty Boop. Os seios, apesar de serem de um tamanho grande o suficiente para caberem na palma de uma mão de um homem adulto, e estarem contidos por um top próprio para ginástica, teimavam em saltar. Para cima, para baixo. Esquerda-direita. Movimento suave, porém perceptível. Seus cabelos lisos e pretos estavam presos como um rabo de cavalo, que, a cada passo, acompanhava num balanço pendular que hipnotizaria instantaneamente QUALQUER ser humano heterossexual do sexo masculino – não posso dar certeza em relação as lésbicas. Sua boca carnuda movia-se, cantarolando “Ouça o que eu digo, não ouça ninguém” do “Engenheiros do Hawaii”. Seu delicado narizinho fazia as narinas dilatarem em busca de mais oxigênio para os pulmões alimentarem o corpo cansado e suado da menina. Seus embasbacadores olhos verdes estavam longe, fora daquele lugar.
            Era de manhã dentro de sua cabeça.
            Estava em sala de aula, no cursinho pré vestibular. Sara era uma prodígia. Começou a estudar um ano mais cedo do que a maioria das crianças, então, já havia se formado no ensino médio. Média 10. Sempre. Uma vez tirou 8,5. Pediu para a professora para fazer a recuperação. Tirou 10.
            Voltando ao cursinho, Sara repassava as aulas do dia na cabeça. Matemática, Biologia e Inglês. Matemática. Viam números complexos (2 + 3i = 13). Biologia, genética: “Azão-azinho” e “Bezão-bezinho”. Inglês... Sara matou. Não assistia aula de inglês. Já era formada a mais de dois anos – estudava desde pequena. Agora cursava alemão – depois que terminou inglês -, aprendeu espanhol sozinha, e arranhava um pouco de russo. Usou o tempo extra na manhã para estudar química. Química era o seu ponto fraco. Foi a tal matéria dos 8,5. Como queria muito passar em medicina, não podia arriscar.
            Foi para casa almoçar. Seus pais não estavam. Nada fora do normal. Já se acostumara. Não gostava da ausência deles, mas entendia que era um mal necessário, pois, se ela tinha tudo o que tinha, era graças a esse esforço deles.
            Pegou os apetrechos e ingredientes necessários para fazer um picadinho de carne com arroz e requentou um pouco de feijão.
            Ao terminar de comer, guardou o almoço no microondas e deixou um bilhete dizendo que tinha feito comida, guardado e onde guardara. Avisou também que ia para o hospital e, logo após, faria sua caminhada tradicional e, só então, voltaria para casa. Feito isso, arrumou suas coisas, tomou um banho e saiu.
            Meia hora depois, estava no hospital. Ala de queimados, mais precisamente. Sara fazia trabalho voluntário ali. Ajudava principalmente crianças e idosos. Lembrou da tragédia que ocorrera com a menina do ônibus que pegou fogo. Luíza, o nome. Pobre menina. Doze anos de idade e mais de 80% do corpo queimado. 70% do rosto queimado, também. Estava decidida! Iria se formar em medicina e especializar-se-ia em queimados e plástica para os mesmos. A idéia de um futuro profissional no qual ela poderia ajudar as pessoas a deixava cada vez mais motivada, decidida e, até mesmo, obcecada. Quando se deu por conta, um sorriso incontido brotou em seus lábios. Uma dupla de rapazotes, que estavam sentados em um banco próximo, viu o sorriso e tiveram vontade de se jogarem aos seus pés naquele exato momento. CATAPLOFT! “Minha Deusa!”. A venerariam ali mesmo. Mas antes de conseguirem agir de qualquer forma, a bela morena passou, como a brisa quente do mar em uma noite de verão, e eles nada fizeram a não ser observar, babar, e balbuciar uma palavra ou duas de baixo calão, mas com o sentido de elogiar Sara.
            Voltando a si, Sara viu que já escurecera. Parou de correr. Alongou-se e foi para casa.
            Sara nunca chegou em casa.
            Seu corpo foi encontrado – 2 dias depois - numa vala na estrada que faz a ligação com a cidade vizinha mais próxima. Estava nua e com inúmeras perfurações de quase 3cm de espessura por 12cm de profundidade. Hematomas, principalmente no rosto, proveniente de socos – provavelmente -, e, no pescoço, a marca de um estrangulamento feito pelas mãos do... Agressor.
            O fazendeiro que a encontrou disse à polícia, em seu depoimento, que na manhã daquele dia, por volta das cinco, os cachorros não paravam de latir e ele resolveu levantar, com arma em punho, para averiguar o que poderia ser. Sua primeira reação foi um choque, mas ao “cair a ficha” chorou. Voltou correndo para casa, chamou a polícia e rezou... Suplicou, na verdade, para que o... Agressor, pelo menos, tenha a estrangulado antes de fazer as perfurações.
            Não havia sinais de estupro.