-
Eu estou em um trem? É isso? – Perguntou para aquela figura infernal que sorria
exibindo, no mínimo, o triplo de dentes que um ser humano possui, sendo todos
pontiagudos e perfeitamente (e assustadoramente) brancos.
-
Isso mesmo, gênio! – Zombou e caiu numa gargalhada grave e desprovida de senso
de humor genuíno. Era algo mais compulsivo e insano, mostrando a Billy que era
a mesma que ele ouvia anteriormente e encerrando o mistério de sua origem.
-
Mas o que diabos eu estou fazendo aqui?! Eu estava no meu caminhão e...
-
Com licença, senhor. – alguém lhe falou enquanto cutucava o seu ombro direito
por trás. Era possível sentir o fio de uma garra afiadíssima. Billy girou
sobressaltadamente sobre seus calcanhares e viu um homem trajando um smoking
negro finíssimo, gravata borboleta, cabelo e barba aparados impecavelmente...
Porém sua pele era tão pálida que chegava próxima a uma tonalidade azulada.
Tinha os olhos totalmente negros e as garras, que agora se revelavam presentes
em cada um dos seus seis dedos das duas mãos, tinham todas uma tonalidade
escarlate e um brilho que, ao oposto do que a cor sugeria, carregava uma
sensação gelada que subia pela espinha de qualquer um. – O senhor gostaria de
um charuto ou de alguma bebida? – Perguntou com um tom convincentemente e
extremamente educado e sincero. Sua voz era suave mas penetrante. Não se podia
dizer se era uma voz grave ou aguda de mais. Era um equilíbrio perfeito.
-
Mas, afinal, onde estou? – Só conseguiu pensar nisso.
-
O senhor se encontra na ferrovia Thunder Dope. Estamos a bordo do Caronte III a
caminho do Styx. – e lhe sugeriu o charuto e uma garrafa de licor. Billy
estacou por um momento sem dizer nada.
Nessa
fração de mudez, só se ouvia a gargalhada daquela criatura que utilizava roupas
de maquinista.
Então,
Billy deu de ombros e pegou um dos charutos e a garrafa.
-
E quem é você? O Diabo, eu presumo...
-
Oh, não senhor, não... Sou apenas um humilde condutor... – E estalou os dedos.
Na escuridão do fundo do vagão, abriu-se uma porta. Selvagens labaredas lambiam
o vão da mesma, cuspindo de suas entranhas uma silhueta que se aproxima a
passos hesitantes. Um par de saltos altos ressoava. Era possível distinguir que
os contornos pertenciam a uma mulher e, gargalhadas depois, que já haviam saído
da zona do “aterrorizante” e caminhado, diferentemente da mulher, a passos
largos e decididos para a margem do “irritante”, podia-se distinguir os seus
traços com detalhes.
Era
uma jovem com cabelos ruivos – laranjas como carvão em brasa. Seus olhos verdes
como esmeraldas exibiam uma expressão de profunda agonia e manchas de lágrimas
de sangue, já negro, pútrido e coagulado, escorriam dos olhos até a ponta do
queixo. No entanto, ostentava um lindo sorriso. Dir-se-ia que era a mulher mais
feliz do mundo. Entretanto, fungava e soluçava como fazem os chorosos, o que
tornava o sorriso algo misticamente congelado e amarelo. Vestia um collant
preto, saltos altos, uma gargantilha com espinhos de ossos, e possuía um lindo
corpo. Diferente do maquinista e do condutor, tinha um aspecto totalmente
humano. Em suas mãos, carregava uma bandeja de prata com uma caixa de charutos,
whisky, absinto, vodka e toda a sorte de copos.
-
Essa é Sabrina. Ela será a sua garçonete. Estará eternamente a sua disposição.
Billy
arqueou as sobrancelhas exibindo toda a sua surpresa e deu uma boa examinada na
moça.
-
Para o que eu quiser? – Perguntou.
-
Para o que quiser. – Respondeu o condutor.
Billy
deu de ombros e sorriu. Só esperava que o inferno fosse um ótimo lugar.
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Inspirado
nas canções "Estrada de ferro Thunder Dope", "Todo ódio da
vingança de Jack Bufallo Head", "E tudo vai ficar pior" e "Quanto mais feio" do Matanza, e "I Still Miss Someone" de
Johnny Cash
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