terça-feira, 21 de setembro de 2010

Especial Farroupilha 1

            - Pois é, tchê, como nós tava proseando, esses dias eu fui láááá no sítio do tio Onório, no Alegrete, e me contaram esse causo que vou te apresentar.
            “Não é que me aparece pra posa durante a semana farroupilha uma prima minha, Marileuza, e o namorado dela, o Norberto”.
            “Marileuza é daquelas meio destrambelhada das idéia, boa gente, mas simplesmente, destrambelhada. Não podemos dizer que se criou no campo, mas ia de vez em quando pro sítio em algum feriado - como o 20 de setembro – se empanturrar com uma janela e, quando apertada de mais, se aliviar na macega”.
            “Já o Norberto... Nunca tinha ido num sítio. Já fora acampar vez ou outra, mas num sítio propriamente falando, nunca. Parecia um piá indo num parque de diversão. E a pilcha? Botou a roupa mais bonita que tinha no armário, calçou uns calçado branco novo. Ficava retrateando com aquele tal de ‘molecular’ – é molecular? Aquele apetrecho que dá de usa como telefone – tudo que se movia e não se movia, como a gauchada reunida, as prenda, os cavalo, as vaca, a Deisi – a porca do tio Onório. Mas, os cabrito ele não conseguia. Só de longe. Então, tio Onório disse pra ele ‘Oh, guri! Que tu ta fazendo? Pra tu chegar perto das ovelha e dos cabrito, tu tens que ir andando agachado, bem devagarinho e por trás delas, se não, elas fogem.’. Norberto, muito inocente, tentou. Uma vez. Duas. Três... Na décima ele desistiu, e como tava longe da gauchada, não tinha escutado ainda as gargalhadas da gurizada. Marileuza ficou braba com a pegadinha que o tio Onório tinha feito com o namorado, mas não podia dizer que vê-lo quase caindo de bunda no chão – sujando a calça nova – umas 9841 vezes – fora ter acreditado na história absurda – não tenha sido engraçado.”.
            “Noutro dia, depois de achar que estava ficando mais esperto e tentando pregar peças no tio Onório, como pedir desenroscar a boca do paliteiro, colocá-lo de cabeça para baixo próximo do tio e, finalmente, pedir ‘Me passa o palito, Seu Onófre’ – errando o nome de propósito – e ter funcionado, tio Onório perguntou pro Norberto se ele não estava a fim de caçar Gambuzinho. Norberto pensou ‘Será que ele não quer dizer gambAzinho?’, mas, pensou que poderia ser uma indelicadeza perguntar ao homem aquilo. Tudo bem que o homem era o tio Onório, mais grosso que dedo destroncado, porém, não conhecia o sujeito ainda, então, concluiu que só poderia se tratar de gambá e, não querendo fazer uma desfeita e até mesmo, quem sabe, poder aprender a atirar ou armar uma armadilha de caça, seria uma grande história para contar para os seus amigos. Topou.”.
            “Saíram, então, as quatro da tarde, tio Onório com a espingarda, Norberto com um saco de pano com cerca de um metro de tamanho e o capataz, Mailso, com uma taquara e uma mochila, bastante surrada já, rumo ao mato. Mailso ia à frente, ficando a taquara. Tinha chovido uns dois dias antes, e não seria legal pisar em falso no meio da macega e torcer o tornozelo, né? Bueno, depois de andarem por uma meia hora, Norberto perguntou o que Mailso trazia na mochila. ‘Isca de gambuzinho’, respondeu o capataz. Norberto pensou e tentou imaginar, mas deixou pra lá. Cinco minutos depois, tio Onório disse ‘Tá vendo aquele buraco ali, guri?’ e apontou para um barranco mais adiante ‘Aquilo é toca de gambuzinho. Vamo fazê o seguinte, pra tu aprender, como faz. Te acoca ali na boca e, quando eu disser já, tu começa a berrar, bate no chão, assim, tu vai assusta o bicho e a gente pega ele com esse saco aí.’. Frustrado por prever que não ia aprender a atirar com uma espingarda e nem armar uma armadilha mirabolante, concordou, afinal, já estava ali, não tinha mais nada a perder. Entonces, assim se sucedeu. Tio Onório e Mailso contornaram o barranco, tio Onório gritou ‘já!’ e Norberto começou o show. Não deu trita segundos e ele escutou vivas do outro lado e um ‘pegamos um bem grandinho!’ e vieram em direção ao Norberto. Abriram o saco e lá estava um bichinho, bem parecido com um gambá, desacordado com um taquaráço na guampa. Norberto ficou orgulhoso de si mesmo e Mailso e tio Onório parabenizaram ele pelo bom trabalho e perguntaram se ele queria caçar mais. Ele disse que sim, e saíram a caminhar atrás de uma nova toca de gambuzinho.”.
            “Caminharam por mais uns dez minutos e acharam uma nova toca. Mesmo plano. Mailso e tio Onório foram para trás do novo barranco da nova toca e Norberto ficou ali no outro lado. ‘Já!’ e Norberto deu novo show. ‘Não deu certo, tenta de novo!’ gritou tio Onório. E Norberto de novo, fez um show mais espetacular. ‘Nada... tenta de novo, agora fica mais tempo gritando e mais alto!’. Norberto, então, respirou fundo, juntou todo o ar que seus pulmões podiam guardar, e soltou em um longo grito gutural seguido de muitas e muitas esperneadas e batidas com os pés e mão no chão. E não foi só uma vez, foram umas quatro vezes. Gritos que duravam cerca de 20 segundos cada. Até que sentiu que faltou guela, e perguntou, confiante, se agora tinha dado certo. Sem resposta. Supôs que tinha falado baixo e perguntou mais alto. Sem resposta. Foi atrás do barranco. Ninguém. Sacanearam ele de novo. Pensou em voltar, mas... Pra que lado? Escolheu um e saiu a caminhar.”.

            - O que? Como ele se saiu dessa? Tio Onório, Mailso, e a Marileuza com sangue nos olhos de tanta raiva do tio pela judiaria com o namorado, encontraram ele por volta das oito da noite no meio do mato.
            - Judiaria? Deixa eu contar essa então, um ano depois.

            “No outro ano, Norberto voltou ao sítio com a Marileuza. Mesma coisa do ano anterior, a diferença é que agora o motivo das piadas era o Claudiomiro, namorado da irmã mais nova da Marileuza, Maria Louise. E foi caçar gambuzinho com o tio Onório de novo, só que agora era ele quem carregava a mochila. Em uma conversa, meses depois, com o tio Onório, ele conseguiu arrancar a confissão de que gambuzinho na verdade não era gambazinho e sim um pega ratão. Não existe. E que o que o Mailso tinha na mochila era um gambá que ele tinha matado na madrugada anterior e que eles tinham colocado em um saco dentro do gelo. Tudo arquitetado especialmente pra fazer a sacanagem com ele.”.
            “Bueno, voltando, agora quem ia com o saco e fazer o berreiro, era o Claudiomiro e o Norberto estava dando o troco do trote.”.

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